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quarta-feira, 30 de abril de 2008

21- A Primeira Fístula...

Voltando ao meu relato, começo o ano de 2003. Esse ano foi bem agitado e por isso vou dividi-lo em etapas: primeiro e segundo semestres... acho que vai dar uns quatro posts... rs

Lembram da dermatite? Pois bem... após a dermatite, mesmo sabendo que o stress estava me prejudicando, voltei a ficar preocupada com a questão financeira. Não queria largar o curso da faculdade, não mesmo. Mas o ano começou com algumas surpresas novas...

Em janeiro notei que estava com um corrimento vaginal diferente dos que conhecia. Era espesso e tinha cheiro forte. Marquei consulta em uma ginecologista e pedi urgência. Consegui uma consulta prá dois dias depois. Era a primeira vez que consultava com essa médica, pois havia mudado de plano de saúde e ainda não tinha marcado os exames ginecológicos de rotina. Também, com tanta coisa acontecendo, tantos exames e consultas em função do Crohn, que pouco estava me importando com o restante. Somos ignorantes mesmo quando se trata de cuidar de nós mesmos. Ignorantes e relapsos.

Cheguei no consultório e, ao exame físico, a médica me disse que havia uma secreção purulenta sim. Mas não identificou nenhum foco de infecção e achava pouco provável que estivesse vindo do útero. O cólo do útero estava limpo e sem sinal da secreção. Achamos estranho aquilo.

Durante esse período comecei a ter picos febris, sempre ao final da tarde e início da noite. Esse é um dado relevante para mim porque nem quando estava com gripe forte ficava febril. A febre variava entre 38 e 39ºC. Começa por volta das 18h e ia abaixando sozinha às 21h, mais ou menos. Hoje sei que, quando a Doença de Crohn está em atividade, a febre no final do dia é comum.

Fizemos os exames de rotina e mandamos amostra da secreção para análise. Quando o resultado chegou, dizia exatamente a mesma coisa que a médica: uma secreção purulenta, mas não definia a origem.

Marquei uma consulta urgente com minha médica para contar essas novidades e ver o que me aconselhava, pois estava sob tratamento com medicação forte. Ela fez o exame físico que todo proctologista faz (aquele mesmo, do toque retal). Após esse exame, eu ainda naquela posição “agradável”, disse-me que estava com uma desconfiança e se eu permitia que me examinasse na vagina. Concordei e mudamos o foco do exame. Só achei estranho porque não mudei de posição. Então ela abriu minha vagina com as mãos, examinou visualmente e apertou na musculatura do assoalho pélvico, entre o canal vaginal e o ânus, mas mais próximo do canal vaginal. Eu senti dor. Ela então pediu que eu me vestisse para podermos conversar. Ela já sabia o que era a secreção.

Vesti a roupa da forma mais atrapalhada possível, pois estava ansiosa demais para me preocupar com isso. Quando cheguei até a mesa, ela estava fazendo um desenho mais ou menos como esse aí (claro que sem tantos detalhes):

(imagem retirada do site: http://www.mulheres.org.br)

Me explicou que o assoalho pélvico tem uns músculos em forma de oito. Em uma parte do “8” fica a vagina e na outra fica o ânus. O espaço existente entre a vagina e o ânus é o períneo. Se vocês localizarem ambos na imagem acima, entenderão melhor a explicação.

E ela então disse o que estava acontecendo comigo: no nosso intestino existem muitas bactérias que formam a nossa flora intestinal. Essas bactérias são normais e necessárias. Como eu tinha inflamação nos intestinos em várias porções distintas e evacuava muito, essas bactérias se locomoviam mais que o normal. E quando chegavam ao ânus, algumas não saiam devido ao esfincter anal (esfincter é um músculo em forma de anel que controla o que entra e sai. Nosso corpo possui vários, entre eles o anal). Essas bactérias então, que não saíam do ânus, iam se acumulando na região.

Para que pudessem se reproduzir e continuar vivendo, já que estavam em um ambiente diferente do que era o normal para elas, “furaram” a parede do ânus e começaram a penetrar por ela. Se a parede fosse de um lado, o “túnel” construído por elas acabaria na minha região glútea. Como esse túnel foi feito na parede oposta, ele “desembocou” na parede do canal vaginal. Como o orifício era muito pequeno e perto da vagina, a ginecologista não visualizou, pois usou aquele aparelho próprio para se enxergar internamente no canal vaginal, perto do cólo uterino (espéculo).

No trajeto do túnel, as bactérias “armaram a barraca" e ali começaram a proliferação. Foi exatamente aí que minha médica apertou e que senti dor. Era a formação de um abcesso. Esse abcesso era a origem do pus e da febre, era uma pequena infecção... ainda brincamos que as bactérias eram espertas, pois estavam trocando a “área de esgoto” pela “área de lazer”... desculpem a brincadeira, mas foi inevitável pensar assim...

Esse “túnel”, a partir de agora, chamaremos de fístula. Fístulas são comunicações existentes entre um órgão e outro, ou entre um órgão e o meio externo. Fiquei sabendo também, nesse dia, que as fístulas não se fecham. Em todo o seu trajeto ocorre a fibrose do músculo, o que impede seu fechamento natural. Seria necessário uma intervenção cirúrgica para o fechamento das extremidades, mas não do trajeto em si, o que ainda não era o meu caso.

Comecei a tratar o abcesso da fístula com antibióticos e, assim, a febre foi cedendo e a secreção diminuindo.

Enquanto isso, a vida continuava...

No próximo post continuo o relato do primeiro semestre de 2003.

Bjim a todos e até lá!

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